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Embora
difamadas pela mídia, estas biomoléculas são
essenciais para a manutenção de várias
estruturas dos seres vivos e atuam e diversos
processos metabólicos.
O Portal de Estudos em
Química apresenta os Lipídios - as biomoléculas
hidrofóbicas.
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Não existe grupos funcionais: em comum, apenas a
hidrofobicidade!

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Mais um caso de termo químico que se incorpora ao senso
comum: os lipídios, há tempos, extrapolaram os livros de
química. Definem um conjunto de substâncias químicas que, ao
contrário das outras classes de compostos orgânicos, não
são caracterizadas por algum grupo funcional comum, e
sim pela sua alta solubilidade em solventes orgânicos e
baixa solubilidade em água. Juntamente com as proteínas,
ácidos nucléicos e carbo-hidratos, os lipídios são
componentes essenciais das estruturas biológicas, e fazem
parte de um grupo conhecido como
biomoléculas. Os
lipídios se encontram distribuidos em todos os tecidos,
principalmente nas membranas celulares e nas células de
gordura.
Existem diversos tipos de moléculas diferentes que pertencem
à classe dos lipídios. Embora não apresentem nenhuma
característica estrutural comum todas elas possuem muito
mais ligações carbono-hidrogênio do que as outras
biomoléculas, e a grande maioria possui poucos heteroátomos.
Isto faz com que estas moléculas sejam
pobres em dipolos localizados (carbono e
hidrogênio possuem eletronegatividade semelhante). Uma das
leis clássicas da química diz que "o semelhante dissolve
o semelhante": daí a razão para estas moléculas serem
fracamente solúveis em água ou etanol (solventes
polares) e altamente solúveis em solventes orgânicos
(geralmente apolares).
Ao contrário das demais biomoléculas,
os lipídios não são polímeros,
isto é, não são repetições de uma unidade básica. Embora
possam apresentar uma estrutura química relativamente
simples, as funções dos lipídios são complexas e diversas,
atuando em muitas etapas cruciais do metabolismo e na
definição das estruturas celulares.
Os químicos podem separar os lipídios de uma amostra
biológica através de uma técnica conhecida como extração; um
solvente orgânico é adicionado a uma solução aquosa da
amostra e, com um auxílio de um funil de separação, obtém-se
a fase orgânica rica em lipídios. Com a evaporação do
solvente orgânico obtém-se o lipídio. É desta maneira que,
em escala industrial, se obtém o óleo vegetal.
Como veremos a seguir, alguns lipídios têm a habilidade de
formar filmes sobre a superfície da água, ou mesmo de formar
agregados organizados na solução; estes lipídios possuem uma
região, na molécula, polar ou iônica, que é facilmente
hidratada. Este comportamento é característico dos lipídios
que compõe a membrana celular. Os lipossomos são "microenvelopes"
capazes de envolverem moléculas orgânicas e entregarem-nas
ao "endereço biológico" correto.
Classificação dos lipídios
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Ácidos Graxos
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A hidrólise ácida dos triacilglicerídios leva aos
correspondentes ácidos carboxílicos - conhecidos como ácidos
graxos. Este é o grupo mais abundante de lipídios nos seres
vivos, e são compostos
derivados dos ácidos carboxílicos. Este grupo é
geralmente chamado de lipídios saponificáveis, porque a
reação destes com uma solução quente de hidróxido de sódio
produz o correspondente sal sódico do ácido carboxílico,
isto é, o sabão.
Os ácidos graxos possuem um
pKa da ordem de 4,8.
Isto significa que, em uma solução onde o pH é 4,8, metade
da concentração o ácido está ionizada; a um pH maior (7, por
exemplo) praticamente todo o ácido encontra-se ionizado,
formando um sal com o seu contra-íon; num pH menor (3, e.g.)
todo o ácido encontra-se protonado.
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A natureza do cátion (contra-íon) determina as propriedades
do sal carboxílico formado. Em geral, sais com cátions
divalentes (Ca2+ ou Mg2+)
não são bem solúveis em água, ao contrário do formado com
metais alcalinos (Na+, K+,
etc.), que são bastante solúveis em água e em óleo - são
conhecidos como sabão. É por este motivo que, em regiões
onde a água é rica em metais alcalinos terrosos, é
necessário se utilizar formulações especiais de sabão na
hora de lavar a roupa. Na água, em altas concentrações
destes sais, ocorre a formação de
micelas - glóbulos
microscópicos formados pela agregação destas moléculas. Nas
micelas, as regiões polares das moléculas de sabão
encontram-se em contato com as moléculas de água, enquanto
que as regiões hidrofóbicas ficam no interior do glóbulo, em
uma pseudofase orgânica, sem contato com a água.
A adição de HCl a uma solução aquosa de sabão provoca a
precipitação do ácido graxo, que é pouco solúvel em água e,
em solução aquosa, tende a formar dímeros através de fortes
ligações hidrogênio.
Composição de alguns óleos e gorduras
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Os ácidos graxos também podem ser classificados como
saturados ou insaturados,
dependendo da ausência ou presença de ligações duplas
carbono-carbono. Os insaturados (que contém tais ligações)
são facilmente convertidos em saturados através da
hidrogenação catalítica (este processo é chamado de
redução). A presença de insaturação nas cadeias de ácido
carboxílico dificulta a interação intermolecular,
fazendo com que, em geral, estes se apresentem, à
temperatura ambiente, no estado líquido; já os saturados,
com uma maior facilidade de empacotamente intermolecular,
são sólidos. A margarina, por exemplo, é obtida
através da hidrogenação de um líquido - o óleo de soja ou de
milho, que é rico em ácidos graxos insaturados.
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Triacilglicerídios
Conhecidos
como gorduras neutras, esta grande classe de lipídios não
contém grupos carregados. São
ésteres do glicerol - 1,2,3-propanotriol.
Estes ésteres possuem longas cadeias carbônicas atachadas ao
glicerol, e a hidrólise ácida promove a formação dos ácidos
graxos correspondentes e o álcool (glicerol).
Nos animais, os TAGs são lipídios que servem,
principalmente, para a
estocagem de energia; as células lipidinosas são
ricas em TAGs. É uma das mais eficientes formas de estocagem
de energia, principalmente com TAGs saturados; cada ligação
C-H é um sítio potencial para a reação de oxidação, um
processo que libera muita energia.
Os
TAGs provindo de animais terrestres contém uma maior
quantidade de cadeias saturadas se comparados aos TAGs de
animais aquáticos. Embora menos eficientes no
armazenamento de energia, as TAGs insaturadas oferecem uma
vantagem para os animais aquáticos, principalmente para os
que vivem em água fria: elas têm uma menor temperatura de
fusão, permanecendo no estado líquido mesmo em baixas
temperaturas. Se fossem saturadas, ficariam no estado sólido
e teriam maior dificuldade de mobilidade no organismo do
animal.
Os TAGs podem ser chamados de
gorduras ou óleos,
dependendo do estado físico na temperatura ambiente: se
forem sólidos, são gorduras, e líquidos são óleos. No
organismo, tanto os óleos como as gorduras podem ser
hidrolisados pelo auxílio de enzimas específicas, as lipases
(tal como a fosfolipase A ou a lipase pancreática), que
permitem a digestão destas substâncias.
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Fosfolipídios
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Os fosfolípideos são
ésteres do glicerofosfato - um derivado fosfórico
do glicerol. O fosfato é um diéster fosfórico, e o grupo
polar do fosfolipídio. A um dos oxigênios do fostato podem
estar ligados grupos neutros ou carregados, como a colina, a
etanoamina, o inositol, glicerol ou outros. As
fostatidilcolinas, por exemplo, são chamadas de lecitinas.

Os fosfolipídios ocorrem em praticamente todos os seres
vivos. Como são anfifílicos, também são capazes de formar
pseudomicrofases em solução aquosa; a organização,
entrentanto, difere das micelas.
Os fosfolipídios se ordenam
em bicamadas, formando vesículas. Estas
estruturas são importantes para conter substâncias
hidrossolúveis em um sistema aquoso - como no caso das
membranas celulares ou vesículas sinápticas. Mais de 40% das
membranas das células do fígado, por exemplo, é composto por
fosfolipídios. Envolvidos nestas bicamadas encontram-se
outros compostos, como proteínas, açúcares e colesterol.
As membranas celulares são elásticas e
resitentes graças às fortes interações
hidrofóbicas entre os grupos apolares dos
fosfolipídios. Estas membranas formam vesículas
que separam os componentes celulares do meio
intercelular - dois sistemas aquosos!
 
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Esfingolipídios
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A principal diferença entre os esfingolipídios e os
fosfolipídios é o álcool no qual estes se baseiam: em vez do
glicerol, eles são derivados de um amino álcool. Estes
lipídios contém 3
componentes fundamentais: um grupo polar, um
ácido graxo, e uma estrutra chamada base esfingóide - uma
longa cadeia hidrocarbônica derivada do d-eritro-2-amino-1,3-diol.
É chamado de base devido a presença do grupo amino que, em
solução aquosa, pode ser convertido para o respectivo íon
amônio. A esfingosina foi o primeiro membro desta classe a
ser descoberto e, juntamente com a di-hidroesfingosina, são
os grupos mais abundantes desta classe nos mamíferos. No
di-hidro, a ligação dupla é reduzida. O grupo esfingóide é
conectado ao ácido graxo graças a uma ligação amídica. A
esfingomielina, encontrada em muitos animais, é um exemplo
de esfingolipídio.
Os vários tipos de esfingolipídios são classificados de
acordo com o grupo que está conectado à base esfingóide. Se
o grupo hidroxila estiver conectado a um açúcar, o composto
é chamado de glicosfincolipídio. O grupo pode ser, também,
um éster fosfófico, como a fosfocolina, na esfingomielina.
Gangliosídios são glicosfingolipídios que contém o ácido
N-acetilneurâmico (ácido siálico) ligado à cadeia
oligossacarídica. Estas espécies são muito comuns no tecido
cerebral.
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Esteróides
Os esteróides são lipídios
derivados do colesterol. Eles atuam, nos
organismos, como hormônios e, nos humanos, são secretados
pelas gônadas, córtex adrenal e pela placenta. A
testosterona é o hormônio sexual masculino, enquanto que o
estradiol é o hormônio responsável por muitas das
características femininas.
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O colesterol, além da atividade hormonal, também desempenha
um papel estrutural - habita a pseudofase orgânica nas
membranas celulares. Muitas vezes chamado de vilão pela
mídia, o colesterol é um composto vital para a maioria dos
seres vivos.
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Prostaglandinas
Estes
lipídios não desempenham funções estruturais, mas são
importantes componentes em vários processos metabólicos e de
comunicação intercelular. Segundo o químico Michael W.
Davidson, da Florida State University, "prostaglandins
act in a manner similar to that of hormones, by stimulating
target cells into action. However, they differ from hormones
in that they act locally, near their site of synthesis, and
they are metabolized very rapidly. Another unusual feature
is that the same prostaglandins act differently in different
tissues". Um dos processos mais importantes controlados
pelas prostaglandinas é a
inflamação.
Todos estas substâncias têm estrutura química semelhante a
do ácido prostanóico, um anel de 5 membros com duas longas
cadeias ligadas em trans nos carbonos 1 e 2. As
prostaglandinas diferem do ácido prostanóico pela presença
de insaturação ou substituição no anel ou da alteração das
cadeias ligadas a ele.
A substância chave na biossíntese das prostaglandinas é o
ácido araquidônico,
que é formado através da remoção enzimática de hidrogênios
do ácido linoléico. O ácido araquidônico livre é convertido
a prostaglandinas pela ação da enzima ciclooxigenase,
que adiciona oxigênios ao ácido araquidônico e promove a sua
ciclização. No organismo, o ácido araquidônico é estocado
sob a forma de fosfolipídios, tal como o fosfoinositol, em
membranas. Sob certos estímulos, o ácido araquidônico é
liberado do lipídio de estocagem (através da ação da enzima
fosfolipase A2) e rapidamente convertido a prostaglandinas,
que iniciam o processo inflamatório. A cortisona tem
ação anti-inflamatória
por bloquear a ação da fosfolipase A2. Este é o mecanismo de
ação da maior parte dos anti-inflamatórios esteróides.
Existem outras rotas nas quais o ácido araquidônico é
transformado em prostaglandinas; algumas envolvem a
conversão do ácido em um intermediário, o ácido
5-hidroperoxy-6,8,1-eicosatetranóico (conhecido como 5-HPETE),
que é formado pela ação da 5-lipoxigenase.
Os anti-inflamatórios não esteróides, como a aspirina, agem
bloqueiando as enzimas responsáveis pela formação do 5-HPETE.
Desta forma, impedem o ciclo de formação das prostaglandinas
e evitam a sinalização inflamatória. |
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