
Já comeu sua vacina hoje?
O Portal de Estudos
em Química mostra que esta questão será comum num
futuro muito próximo.
Alimentos geneticamente modificados irão dar conta
da vacinação que, hoje, ainda é dolorida.
O Portal de
Estudos em Química
(PEQ) apresenta as Vacinas Comestíveis! |
Um dos principais avanços
da medicina no último século foi a introdução das
vacinas, que fizeram milagres reais contra as doenças
infecciosas. Mortes por sarampo, poliomelite ou tétano
passaram a ser objeto de estudo de historiadores.
Entretanto, mesmo após décadas e milhares de campanhas de
vacinação, mais de 30% das
crianças de todo o mundo não têm acesso às vacinas mais
importantes: contra difteria, tuberculose, tétano
e polio. Desta forma, mais de 4 milhões de mortes por estas
infecções ocorrem, desnecessariamente, a cada ano. Mesmo no
Brasil a vacinação não atinge todos os cantos: milhares de
crianças passam à margem do serviço de saúde pública. A
situação é ainda mais crítica em países pobres ou em
conflitos sociais, onde o serviço público sequer existe.
Brigadas internacionais, como a Red Cross ou o
Salvation Army, tentam desesperadamente auxiliar estes
seres humanos, mas o seu progresso é mais lento do que a
foice da morte.
No início da década de 1990,
Charles Arntzen,
do Texas A&M University, imaginou uma forma de
resolver estes problemas de uma maneira muito barata e
eficaz: ele viu, durante uma visita a Bangkok, uma
mãe tentando introduzir um pedaço de banana em seu filho já
falecido.
Tarde demais, mas somente para aquela criança, pensou ele: a
solução, talvez, fosse a de preparar alimentos geneticamente
modificados, capazes de produzir vacinas. Bananas,
batatas ou tomates que, ao serem consumidos, estariam
provindo o organismo com as inoculações necessárias.

cientistas já fazem plantas com vacinas |
As vantagens seriam enormes:
as plantas poderiam crescer no local onde fossem
necessárias, sem muitos custos. Os problemas logísticos,
econômicos e políticos, comumente relacionados à
distribuição normal de vacinas, também seriam minimizados.
E, ainda, estas vacinas não requeririam seringas que, além
de serem caras e causarem medo, podem ser contaminadas.

amostras foram testadas em ratos |
Após 10 anos de estudos e testes (inclusive em humanos), os
resultados são promissores: as vacinas comestíveis podem
funcionar. Entretanto, há ainda um pouco de receio dentre a
comunidade científica: existe a especulação de que estas
vacinas poderiam suprimir a autoimunidade - fazendo com que
as defesas do corpo ataquem, por engano, células sadias.
Doenças como a diabetes tipo I e outras são associadas com
disordens na autoimunidade.
Independentemente da forma como as vacinas são aplicadas,
todas têm o mesmo objetivo:
ensinar o sistema imunológico
a destruir certos agentes causadores de doenças antes que
estes agentes possam se multiplicar o suficiente para causar
sintomas. De uma maneira geral, as vacinas contém vírus ou
bactérias que foram desativados ou, ainda, mortos.
Ao detectar a presença de um organismo extrangeiro em uma
vacina, o sistema imunológico se comporta como se o
organismo estivesse sob ataque de um potente antagonista.
Várias forças são mobilizadas para
encontrar e destruir
o invasor. Na primeira fase, é necessário se descobrir como
o agente patógeno pode ser aniquilado. Novas proteínas são
codificadas - os antígenos
- em função do tipo do invasor. Mesmo após finda a
"batalha", certas células de "memória" permanecem na
corrente sanguínea, alertas, capazes de identificar
novamente este invasor e codificar o antígeno correto. Em
alguns casos, esta memória é permanente; noutros, como no
caso da cólera ou tétano, a vacina precisa ser
readministrada periodicamente.

estas mudas de banana já contém vacinas |
Mais recentemente, uma inovação ocorreu no mundo das
vacinas. A sociedade e boa parte da comunidade científica
temia que, no caso das vacinas clássicas, os microorganismos
desativados, de alguma forma, ressucitassem e provocassem as
doenças que deveriam evitar. Por isso, os fabricantes
passaram a produzir as chamadas "sub-unidades", que são
apenas as proteínas
antígenas, divorciadas dos genes patológicos.
Entretanto, estas novas vacinas são bastante caras, pois sua
produção é bastante requintada: envolve a cultura de
bactérias ou células animais, devem ser purificadas e sempre
necessitam de ser refrigeradas. Estas vacinas devem sempre
ser injetadas na corrente sanguínea, pois são denaturadas
pelo suco gástrico.

vacina contra diarréia |
Esta mesma técnica está sendo aplicada nas vacinas
comestíveis, que também contém sub-unidades. A grande
vantagem é que não necessitam ser refrigeradas, pois o
alimento rotege as proteínas da degradação. E, dentro das
células vegetais, as vacinas encontram-se protegidas do suco
gástrico, sendo liberadas gradativamente já no intestino
delgado.
Desde o início das pesquisas com vacinas em alimentos, os
pesquisadores desconfiavam que estas vacinas também teriam
ação sobre a imunidade
mucosal. Muitos agentes patológicos entram no
corpo via nariz, boca ou órgãos genitais; a primeira defesa
do organismo é uma série de membranas mucosas, localizadas
nestas regiões. As vacinas injetáveis, em geral, não
estimulam a defesa mucosal; as vacinas comestíveis,
teoricamente, deveriam ser mais ativas nesta imunidade, pois
entra em contato íntimo com a mucosa do intestino. Deveriam,
portanto, serem capazes de ativar a imunidade mucosal e
sistêmica. Este efeito seria ótimo contra doenças como a
diarréia, por exemplo.

Escherichia coli |
A maior parte dos cientistas envolvidos com vacinas
comestíveis está pesquisando
formas de combater a diarréia,
que é provocada por vários agentes, como o Norwalk virus,
o Vibrio cholerae e Escherichia coli.
Cerca de 3 milhões de crianças morrem anualmente por causa
destes agentes, que são capazes de perturbar as células do
intestino delgado, provocando a liberação excessiva de água
dos tecidos. A única terapia disponível é a re-hidratação,
mas algu;as vezes não é suficiente. Não existe vacina,
ainda, de alcance mundial para a moléstia.
No Brasil, a morte por diarréia é, infelizmente,
muito comum em várias regiões.
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Em 1995, Arntzen conseguiu obter plantas de tabaco que
produziam uma proteína antígena para o vírus da hepatitis B;
testou em ratos e estes se tornaram imune à doença. Também
neste ano, William H. R. Langridge da Loma Linda
University obteve tomates
e batatas com vacinas para as três principais
causas da diarréia. Alimentando animais (ratos, coelhos e
macacos) com estas frutas ou tubérculos, conseguiram
resultados excelentes: as cobaias tiveram respostas
positivas de imunidade mucosal e sistêmica, e não contrairam
a doença quando expostas aos agentes patológicos reais.

humanos já testaram as vacinas comestíveis |
Estes e outros testes preliminares, em animais, serviram
para indicar que os humanos também deveriam ser testados.
Arntzen foi o primeiro cientista a testar vacinas
comestíveis em pessoas. Em 1997, vinte voluntários comeram
batatas não cozidas, contendo a sub-unidade B da toxina da
E. coli. Todos apresentaram estímulos das imunidades
sistêmica e mucosal. O mesmo grupo comeu outras batatas,
contendo vacina contra o Norwalk virus; 19 dos vinte tiveram
esultados positivos. No ano seguinte, Hilary Koprowski do
Thomas Jefferson University deu alface geneticamente
modificada para conter um antígeno da hepatitis B para três
voluntários; dois ficaram imunes a doença.
Estes resultados parecem deixar claro que as vacinas
comestíveis são, de fato, eficazes. A comunidade científica
vê com bons olhos e vários órgãos de saúde pública, como a
NIH e a Unicef, já investem bastante dinheiro nesta área.
Entretanto, várias questões ainda devem ser respondidas, e
vários problemas precisam ser resolvidos, antes da liberação
em massa destas vacinas.

cientistas testam bananas |
Dentre os obstáculos, está a escolha das plantas corretas -
e cada planta apresenta
seu próprio desafio. As batatas são ideias: se
propagam rapidamente e podem ser estocadas por longos
períodos. A desvantagem é que devem ser ingeridas sem
cozimento, o que não é uma prática comum. As folhas de
tabaco, extensivamente estudadas, não fazem parte da dieta
de nenhuma população. As
bananas não precisam ser cozidas, mas suas
árvores levam anos para dar frutos, e estes são sazonais.
Além disso, após colhidas as bananas apodrecem rapidamente.
Por isso, mais plantas tem sido testadas, como alface,
cenouras, amendoins, trigo, milho arroz e soja.
Como fazer uma
vacina comestível?
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O preparo de uma planta-vacina segue
alguns passos comuns. O primeiro deles, consite na
exposição das células da planta às bactéricas
causadoras da doença. Esta bactéria contém um
gene que a torna imune a ação do antibiótico.


Após um certo tempo de cultura, um forte
antibiótico é adicionado ao meio - todas as
células da planta que não tiverem sofrido
transferência genética irão morrer. É uma forma de
separar o "joio do trigo".

A próxima etapa consiste na brotação e
enraizamento do callus. Depois, é só
plantar e gerar uma muda.
Pronto: a vacina está na horta! |
Outra questão: o consumo cotidiano de vacinas poderia causar
um fenômeno conhecido como
tolerância oral -
o organismo pode simplesmente passar a desligar suas defesas
contra estas proteínas, se tornando suceptível ao ataque do
agente patológico real. Além disso, alguns cientistas
advertem para o fato de que a mãe que come o alimento com
vacina estaria indiretamente vacinando o seu filho, quer
seja o feto, através da placenta, ou o bebê, pela
amamentação.
Existem ainda problemas
não científicos: várias empresas farmacêuticas
estão tentando por descrédito na estratégia das vacinas
comestíveis, por razões óbvias: o mercado das vacinas
injetaveis representa bilhões de dólares. Além de não
patrocinar pesquisas nestas áreas, muitas empresas passaram
a denegrir os resultados até então obtidos. Outro desafio
não científico é que estas vacinas caem no jargão popular de
"alimentos geneticamente modificados": a mídia
tem feito campanha ostensiva, infudada e inadvertidamente,
contra estes alimentos. A população amedrontada pode não
aderir a esta nova forma de vacinação.

Breve, isto será coisa do passado |
No Brasil,
ainda há outro problema: parece um absurdo dizer que teremos
como solução vacinas comestíveis, se em várias áreas de
nosso país crianças ainda
morrem de fome. Se não chegam alimentos, muito
menos vacinas comestíveis. A vacinação é uma etapa posterior
a do fim da fome. Os programas sociais do governo na área da
saúde têm se mostrado ineficazes: milhares de crianças
morrem anualmente de desnutrição.
Todavia, a pesquisa continua. Mais testes precisam ser
feitos, problemas devem ser solucionados e a população deve
ser convencida. Entretanto, é inevitável:
brevemente teremos, na mesa,
nossas vacinas.
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