Novo Metal Orgânico:
Paládio Quiral

O paládio é um metal de transição muito
utilizado como catalisador em reações químicas, como por
exemplo, nas reações de hidrogenação e nas reações de
acoplamento carbono-carbono. A figura 1 mostra algumas
reações de acoplamento carbono-carbono catalisadas por
paládio.
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Figura 1.
Algumas reações de acoplamento carbono-carbono
catalisadas por paládio
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O grupo de
Rothenberg (Universidade de Amsterdã, Holanda), em
parceria com pesquisadores israelenses, publicou
recentemente na revista
Nature Chemistry, um trabalho onde “paládio quiral”
foi preparado.
A
quiralidade está relacionada a objetos que não são
sobreponíveis à sua imagem no espelho. Moléculas quirais
geralmente não possuem elementos de simetria e desviam a luz
polarizada para a direita (+) ou para a esquerda (-).
Um dos desafios da química atual é dopar os metais com
moléculas orgânicas quirais criando, assim, uma superfície
metálica quiral. Primeiramente, é realizada a dopagem do
metal com a molécula quiral, e depois a molécula orgânica é
removida. Ao metal que restou na amostra é então conferida
uma propriedade quiral proveniente da molécula que o dopou.
Com isso temos um metalorgânico e não um organometálico, já
que a parte orgânica foi retirada da amostra, restando
apenas um metal com características quirais. O metal em si
mantém todas as suas propriedades habituais, tais como a
maleabilidade, a condutividade e a atividade catalítica.
Como dopante, no trabalho recém publicado, foram usados
alcalóides da quina. A figura 2 mostra uma espécie da
planta do gênero Cinchona e seus principais
alcalóides.
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Figura 2. Cinchona officinalis
(Figura do Wikimedia Commons) e alcalóides
principais do gênero |
Os compostos contendo o paládio dopado com as moléculas
orgânicas foram preparados dissolvendo-se os dopantes numa
solução aquosa de um sal de Pd2+ e na presença de um agente
redutor. Foi adicionado dodecil sulfato de sódio (DSS) para
dissolver os alcalóides, como mostra o esquema 1. O material
de interesse precipita como um pó preto.
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Esquema 1. Reação de dopagem do
paládio
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Este processo de dopagem não é uma
adsorção da molécula orgânica na superfície do metal. Ao
contrário, há um aprisionamento dessas moléculas entre os
cristalitos de paládio, resultando numa estrutura hibrida
metalorgânica tridimensional que é quiral. É um processo
chamado de impressão ou imprinting já que se
imprime no metal uma característica do alcalóide que foi
removido.
Pela difração de pó de Raios X foi possível verificar
diferenças entre as amostras contendo paládio antes da
dopagem com o alcalóide, do paládio dopado com a cinchonina
e da amostra contendo o paládio após a remoção do dopante
com dimetilsulfóxido (DMSO).
Foi mostrado por difração de Raios X que o paládio dopado
com a cinchonina possui sinais correspondentes a Carbono,
Nitrogênio e Oxigênio na amostra na faixa entre 15º e 35º,
mostrando que a dopagem foi efetiva, já que esses sinais não
aparecem na amostra com paládio antes da dopagem. Após a
extração da molécula orgânica com o DMSO esses sinais também
não são percebidos, mostrando que a extração do alcalóide
foi eficaz.
A quiralidade do metal foi comprovada em vários experimentos
realizados em colaboração com o grupo do professor Ron
Naaman, do Instituto de Ciência Weizmann, em Rehovot,
Israel. Como todos os metais, o paládio apresenta efeito
fotoelétrico: quando um fóton de alta energia atinge o
metal, um elétron é ejetado.
A distribuição de energia fotoelétrica realizada nas
amostras com paládio sem nenhuma modificação quiral mostrou
que a intensidade da luz polarizada no sentido horário
coincide com a intensidade da luz polarizada no sentido
anti-horário, demonstrando que não há quiralidade no metal.
Isso já não acontece nas amostras com paládio após a dopagem
e após a extração da molécula orgânica com DMSO. Como o
material mostrou diferentes interações com a luz,
demonstrou-se que a quiralidade foi conferida ao paládio
pela molécula orgânica extraída.
Os materiais contendo o paládio dopado com as moléculas
orgânicas foram aplicados em reações enantiosseletivas. Como
exemplo, na hidrogenação da isoforona, foi usado paládio
dopado com cinchonidina (CD) ou com cinchonina (CN),
seu pseudoenantiômero, resultando em 16% de
excesso enantiomérico (ee) do isômero (R) e
6,5% de ee do isômero (S), respectivamente (Esquema
2).
Entretanto, utilizando o paládio antes da dopagem ou quando
a molécula orgânica foi retirada do catalisador dopado, não
houve estereosseletividade na reação.
Isso indica que o alcalóide quiral deve se coordenar ao
substrato para realizar essas reações enantiosseletivas.
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Esquema 2.
Hidrogenação da isoforona utilizando cinchonidina (CD)
ou cinchonina (CN) como dopante do paládio |
Embora a eficiência do paládio quiral nas reações
enantiosseletivas tenha sido pequena, este trabalho abre
portas para a síntese de novos metalorgânicos com aplicações
na catálise assimétrica heterogênea.
É importante ressaltar que até agora apenas aos metais ouro
e prata foram conferidas propriedades quirais através do
método de impressão ou imprinting.
Agradecimentos: Ao doutorando José
Celestino de Barros Neto (IQ-UFRJ) pelas sugestões.
Referências Bibliográficas
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Matéria do ScienceDaily de 24 de abril de 2009.
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e beta-ciclodextrinas. Dissertação de Mestrado, Rio
de Janeiro: UFRJ/NPPN, 2008.
Para saber mais:
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Goldsmith, M. R. ; George, C. B.; Zuber, G.; Naaman, R.;Waldeck,
D. H.; Wipf, P.; Beratant, D. N. Phys. Chem. Chem. Phys.
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Para
citar esta matéria:
Silva, A. C., Novo metalorgânico: Paládio quiral?
Novidades na Ciência - SBQ Rio, 10 Junho 2009.
Disponível em: <http://www.uff.br/sbqrio>
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