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OS
RAIOS-X |
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O escocês James Clerk Maxwell, em
meados do século passado, previu a existência e a natureza das ondas
eletromagnéticas, que incluem até a luz que vemos todo o dia. Em
1887, o alemão Heinrich Hertz produziu as primeiras ondas
eletromagnéticas artificiais (ondas de rádio), usando dicas de
Hermann Helmoltz. Entre outras coisas, Helmoltz sugeriu que uma
radiação eletromagnética de alta frequência deveria interagir
fracamente com a matéria e, portanto, ser muito penetrante. Helmoltz
até indicou o equipamento adequado para produzir essas ondas
penetrantes: a "ampola de Crookes", onde residiam os festejados e
misteriosos "raios catódicos".
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Muita gente na Europa
começou a procurar esse tipo de radiação. Entre eles, o maior
especialista em raios catódicos da Alemanha, Philipp Lenard. Mas,
quem chegou primeiro foi Wilhelm Conrad Roentgen, em 8 de novembro
de 1895. Foi ele quem descobriu e batizou os raios-X, além de fazer
a primeira radiografia da história.
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Wilhelm Roentgen |
Nas seções listadas abaixo,
contaremos um pouco da história dessa descoberta. Falaremos também
do uso moderno dos raios-X na medicina e na pesquisa dos materiais,
mencionando outras figuras importantes como Max von Laue e os Bragg,
pai e filho. |
A AMPOLA DE
CROOKES E OS MISTERIOSOS RAIOS CATÓDICOS
Todo mundo tem um tubo
de raios catódicos em casa, dentro de seu aparelho de televisão.
Você está, agora mesmo, na frente de um, o monitor de seu micro.
Quem inventou esse tubo e produziu os primeiros raios catódicos foi
o inglês William Crookes, nos anos 70 do século passado.
A "ampola de Crookes" é feita de vidro ou quartzo e dentro dela se
faz o vácuo. Ela contém duas placas metálicas ligadas a uma fonte de
tensão elétrica. A placa ligada ao pólo negativo é chamada de catodo
e a outra, ligada ao pólo positivo, é o anodo. Quando a tensão entre
o catodo e o anodo fica bem elevada surge um feixe luminoso que sai
do catodo e atravessa o tubo. São os "raios catódicos". |
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Em 1895, quando Roentgen descobriu
os raios-X, ninguém sabia o que eram esses misteriosos raios
catódicos. Os alemães achavam que eram uma forma de onda
eletromagnética mas seus argumentos não eram totalmente
convincentes. Foi só em 1897 que o inglês J. J. Thomson mostrou que
esses raios são formados por partículas carregadas negativamente.
Hoje, sabemos que essas partículas são elétrons. Quando os elétrons
saem do catodo e atingem o anodo ou a parede interna do tubo dá-se
uma troca de energia. A energia cinética dos elétrons é convertida,
parte em calor e parte em radiação eletromagnética. E hoje também
sabemos que essa radiação é o que conhecemos como raios-X. Pense na
seguinte analogia: um alvo metálico pesado é atingido por uma rajada
de balas. Boa parte da energia cinética das balas será dissipada
arrebentando e aquecendo o alvo, mas, outra parte é transformada em
ondas sonoras (boing! boing!). No caso dos elétrons, as ondas não
são de som. São ondas eletromagnéticas, invisíveis e de tão alta
frequência que conseguem atravessar o vidro do tubo e se espalham
pelo exterior. Isso acontece inclusive em sua televisão e em seu
monitor. Felizmente, os fabricantes desses tubos modernos usam
materiais diferentes daqueles utilizados nos antigos tubos de
Crookes. Esses novos materiais absorvem os raios-X produzidos na
freiada dos elétrons, impedindo que eles cheguem até você e causem
algum dano.
Na última década do século 19 muita gente na Europa estava
investigando as propriedades dos raios catódicos. Nessas
investigações, certamente, estavam produzindo raios-X, mas não
sabiam nem reparavam. O caso é que essa radiação interage pouco com
a matéria, logo, não é tão fácil detetá-la. E foi aí que entrou a
sorte e o talento de nosso Roentgen. Depois dessa introdução podemos
contar como foi que ele descobriu os raios-X. |
WILHELM ROENTGEN DESCOBRE OS
RAIOS-X
Em 1895 Wilhelm
Roentgen procurava detetar a radiação eletromagnética de alta
frequência prevista por Helmoltz. Ele dispunha de um tubo de raios
catódicos com excelente vácuo e usava, como fonte de alta tensão
elétrica, uma bobina de indução parecida com essas que alimentam as
velas de um carro, só que maior. Tinha, também, por perto, uma placa
fluorescente de cianeto de platina e bário. Esse material fluoresce,
isto é, fica um pouquinho luminoso, quando recebe radiação, visível
ou não. É como aqueles sinais de estrada que brilham no escuro. Uma
placa desse tipo fluoresce quando atingida pelos raios catódicos e
era por isso que fazia parte do equipamento de Roentgen.
Para facilitar a observação da fraca luminosidade da placa
fluorescente, Roentgen fechou as cortinas do laboratório e cobriu o
tubo de raios catódicos com uma caixa de papelão. Veja na foto
abaixo o palco do drama: o laboratório de Roentgen, mais ou menos
como era em Novembro de 1895.
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Foto recente do
laboratório de Roentgen no Instituto de Física de Würzburg. Hoje, é
um museu mas mostra, mais ou menos, como era seu local de trabalho
quando Roentgen descobriu os raios-X. À direita, está a janela cuja
cortinas ele fechou para melhor observar a fluorescência de seu
detetor. |
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No escuro, Roentgen ligou o tubo de
raios catódicos à eletricidade. E aí notou, no fundo da sala, um
pequeno brilho, quase imperceptível. Nisso, talvez, foi ajudado pelo
fato de ser daltônico. Dizem que daltônicos conseguem ver melhor no
escuro que gente de visão normal. Mas, que brilho era esse? Desligou
a eletricidade do tubo e o brilho sumiu. Ligou de novo, e lá estava
a luzinha novamente. Abrindo as cortinas da janela ele verificou que
o brilho vinha de sua placa fluorescente, lá no canto da sala.
Repetiu o teste, colocando a placa mais perto do tubo que ainda
estava coberto pela caixa de papelão. E viu a placa fluorescer com
maior intensidade! Afastando a placa do tubo o brilho diminuía.
A partir daí, foi uma festa de novas observações. Roentgen tinha
certeza que estava detetando um tipo de radiação diferente. Não
eram, certamente, os próprios raios catódicos saindo do tubo pois já
era sabido de todos os pesquisadores que esses raios catódicos só se
propagavam no vácuo. No ar, eles eram rapidamente absorvidos e não
alcançavam mais que poucos centímetros. Colocando placas de madeira
ou metal entre o tubo e o detetor, Roentgen aprendeu que a radiação
que estava detetando era realmente muito penetrante. Só uma placa de
chumbo conseguia bloqueá-la totalmente. E aí fez uma observação
crucial. Segurou um pequeno disco de chumbo na frente do detetor
fluorescente, com a intenção de ver a sombra do disco na placa. E
viu, não apenas a sombra do disco, mas também a sombra dos ossos de
sua própria mão!
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Nas semanas seguintes,
Roentgen trabalhou intensamente, examinando todos os aspectos da
radiação que acabara de descobrir. Para obter resultados
permanentes, possíveis de publicar nas revistas, passou a usar
placas fotográficas no lugar do detetor fluorescente. Em uma de suas
experiências, colocou a mão de sua mulher, Bertha, na frente do
filme e obteve a primeira radiografia da história, mostrando os
ossos de Dona Bertha e até seu anel de casamento. |
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Em outra experiência, tirou a
radiografia de seu rifle de caça e observou uma pequena falha
interna. Com isso, ele antecipou um dos usos atuais dos raios-X:
descobrir falhas internas em peças industriais. Também radiografou
uma caixa de madeira fechada com peças metálicas no interior. Fez,
portanto, o que hoje se vê nos aeroportos, onde as bagagens são
radiografadas pelo pessoal da segurança. |
Radiografia tirada por Roentgen
de seu rifle de caça. Observe que há um pequeno defeito no cano. Com
essa foto, Roentgen antecipou o uso industrial dos raios-x como
controle de qualidade de peças. |
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Antes mesmo de ser publicada em uma
revista científica, a descoberta de Roentgen chegou aos jornais e
causou enorme sensação. Os médicos logo viram o potencial da
radiação para diagnóstico e terapia. A fama de Wilhelm Roentgen
espalhou-se pelo mundo e todos os grandes laboratórios começaram a
produzir, pesquisar e utilizar a radiação de alta frequência que ele
chamou, modestamente, de Raios-X.
O primeiro Nobel de Física foi concedido em 1901, muito
merecidamente, a Wilhelm Conrad Roentgen, então com 56 anos.
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PHILIPP LENARD, UM FÍSICO
MAU-CARÁTER
O húngaro Philipp
Lenard trabalhava ativamente, na Alemanha, com tubos de raios
catódicos, nos últimos anos do século dezenove. Em 1888, ele tentou
observar as radiações de alta frequência previstas por Helmoltz mas
não obteve sucesso. Hoje se sabe porque. O vácuo de seus tubos não
era adequado e a tensão elétrica entre o catodo e o anodo não era
suficientemente alta. Por várias vezes ele passou perto mas, apesar
de ser um físico experimentado e dispor de excelente laboratório,
acabou atropelado pela sensacional descoberta de Roentgen.
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O trabalho de Lenard era conhecido
e respeitado. Suas publicações facilitaram o trabalho de Roentgen,
foram úteis na descoberta do elétron por J. J. Thomson e no
desenvolvimento da teoria do efeito fotoelétrico, que deu a Einstein
o prêmio Nobel.
Mas, Lenard era um cara rancoroso e achava que merecia o crédito
por todas essas descobertas. Várias vezes disse: "Roentgen foi a
parteira dos raios-X, mas a mãe fui eu". Nem mesmo o prêmio Nobel
que recebeu, em 1905, pelo conjunto de sua pesquisa com os raios
catódicos, foi suficiente para dissipar seu ódio. E olhe que esse
prêmio nem foi tão merecido. Lenard achava que os raios catódicos
eram ondas eletromagnéticas. Quando J. J. Thomson provou que eram
partículas (os elétrons) ele foi obrigado a mudar de idéia, mas
passou a incluir o velho J. J. entre seus desafetos.
Anos mais tarde, quando os nazistas tomaram o poder na Alemanha,
Lenard logo se juntou a eles e passou a atacar o que chamava de
"física de judeus", onde incluía toda a relatividade. Escreveu um
livro chamado "Física Alemã", onde os nomes de Einstein e Roentgen
nem eram citados. Morreu em 1947, depois de ver o "Reich de 1000
anos" ser destruído. |
APLICAÇÕES MODERNAS
DOS RAIOS-X NA MEDICINA
Não vamos falar em radiografias,
imagens de ossos quebrados ou pulmões infiltrados. Esse tipo de
coisa é lugar comum desde que Dona Bertha pôs a mão na frente do
feixe de raios-X do marido.
Falaremos em duas aplicações bem mais modernas: a tomografia
computadorizada e a terapia tomográfica.
Tomografia computadorizada
Uma imagem normal de raios-X é planar: o paciente fica entre o
tubo de raios-X e o filme fotográfico. O que se obtém é uma projeção
em duas dimensões (a "chapa") do interior do corpo do paciente.
Em 1972, Godfrey Houndsfield e Allan Cormack criaram a técnica
chamada tomografia computadorizada (T.C.). Por esse trabalho
receberam o prêmio Nobel de Medicina em 1979. Na T. C. o raio-X é
concentrado em um feixe estreito que passa apenas por uma pequena
parte do corpo. A intensidade do raio-X que chega em um detector é
convertida em um sinal digital. Movendo-se o emissor de raios-X e o
detector obtém-se sinais de outros pontos do corpo, em ângulos
variados. É o que se chama de "varredura" do feixe. Esse processo é
repetido várias vezes para ângulos ligeiramente diferentes. Os
detectores armazenam os valores da intensidade dos raios-x.
Matematicamente, esses valores constituem a "transformada de
Fourier" do objeto examinado. O computador processa essas
transformadas e reconstrói uma imagem tri-dimensional do interior do
corpo do paciente. Nos tomógrafos mais modernos apenas a fonte de
raios-X é movida. A detecção é feita em um anel de detectores que
envolve o objeto examinado.
Terapia tomográfica
Assim que Roentgen descobriu os raios-X, os médicos já começaram
a usá-los no tratamento do câncer. A técnica consiste em bombardear
o tumor com uma dose de radiação suficiente para matar as células
cancerosas. O desafio é matar apenas as células malignas sem afetar
as células normais que ficam por perto.
A tomografia computadorizada e, mais recentemente, a ressonância
nuclear magnética, ajudam bastante na localização e delimitação do
tumor. Recentemente, os médicos e físicos viram que poderiam fazer a
detecção e o tratamento simultaneamente. A T. C. seria usada para
localizar e bombardear a região afetada. É o que se chama de
terapia tomográfica. Parece simples, mas não é. Os tumores
costumam ser objetos altamente irregulares e assimétricos, exigindo
uma tremenda precisão no posicionamento do feixe e na dosagem da
radiação. Novos detetores e sofisticados programas de computador
estão sendo testados para alcançar esse objetivo com raios-X de alta
intensidade e focalização precisa.
Nesse tipo de tecnologia a cooperação entre os médicos e os
físicos e engenheiros é intensa. Essa é uma área de pesquisa em
franco desenvolvimento, de onde podemos esperar enormes progressos,
nos próximos anos. |
INTERFERÊNCIA CONSTRUTIVA E
DESTRUTIVA
Na seção seguinte
falaremos sobre a difração de raios-X em cristais. Antes disso,
precisamos explicar o que é difração. E para explicar o que é
difração, precisamos dizer como uma onda interfere com outra onda.
A figura ao lado mostra o que chamamos uma onda bem comportada, onda
dos físicos. É um padrão de altos e baixos que se sucedem e se
deslocam em conjunto. Vemos algumas das características de uma onda.
O comprimento de onda, designado pela letra grega lambda,
mede o comprimento do padrão que se repete. A amplitude A
mede o tamanho de cada máximo da onda. A velocidade v mede a
distância percorrida pelo padrão em uma unidade de tempo. Se essa
onda representasse uma onda de luz visível o comprimento de onda
teria algum valor entre 0,00045 centímetros (luz violeta) e 0,00075
centímetros (luz vermelha). |
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Existe outra
propriedade de uma onda, a fase, que é melhor de entender se
a gente olhar duas ondas ao mesmo tempo. Na figura ao lado, as ondas
(1) e (2) têm a mesma amplitude, o mesmo comprimento e a mesma
velocidade, mas, a onda (2) está adiantada em relação à onda (1).
Para distinguir uma da outra, dizemos que elas têm fases diferentes.
A fase de uma onda, normalmente, é apresentada como um ângulo, mas,
vamos medí-la aqui como uma distância. Diremos, então, que as ondas
(1) e (2) têm uma diferença de fase de /4,
isto é, de um quarto do comprimento de onda. Quase sempre o
importante é a diferença de fase entre duas ou mais ondas; o valor
da fase de cada uma delas não interessa. |
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Quando duas ondas
resolvem ocupar a mesma região do espaço dá-se o que chamamos de
interferência. O resultado da interferência entre duas ondas
depende da diferença de fase entre elas. Na figura (A), vemos duas
ondas, uma pintada de azul e a outra, de vermelho, praticamente
coincidentes. As duas têm a mesma amplitude, o mesmo comprimento e
a mesma fase; a diferença de fase entre elas é zero. Nesse
caso, a interferência é chamada de construtiva: uma onda
soma-se à outra e o resultado é uma única onda cuja amplitude é a
soma das duas amplitudes. |
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Na figura (B), as duas
ondas têm uma diferença de fase de meio lambda. Isso faz com
que um alto de uma delas coincida com um baixo da outra. Acontece,
então, uma interferência destrutiva entre elas. O resultado é
que uma anula completamente o efeito da outra. Nessa região não
haverá mais onda nenhuma. |
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Na figura (C), as duas
ondas têm uma diferença de fase genérica. A interferência entre elas
não é totalmente construtiva nem totalmente destrutiva. O resultado
é uma onda única cuja amplitude tem qualquer valor entre zero e a
soma das amplitudes das ondas, dependendo da diferença de fase entre
elas. Deu para entender? |
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E a difração? A difração é, em
última análise, uma interferência entre várias ondas. No caso que
nos interessa, a difração de raios-X, veremos que a interferência
será causada por diferenças de fases entre as ondas causadas por
diferenças nos caminhos que elas percorrem. Elas começam em fase,
tudo direitinho, mas, por razões que veremos a seguir, umas se
atrasam das outras, surgindo uma diferença de fase entre elas. Por
causa dessa diferença de fase elas interferem entre si. Veja mais
detalhes na seção seguinte. |
VON LAUE, OS BRAGG E A
DIFRAÇÃO DE RAIOS-X
J. J. Thomson mostrou
que os raios catódicos eram corpúsculos carregados negativamente -
os elétrons. Mas, ninguém, nesse tempo, sabia ainda o que eram os
raios-X. O palpite geral era que esses penetrantes raios deveriam
ser ondas eletromagnéticas, como previsto por Helmoltz. Mas, para
tirar as dúvidas, era preciso verificar se um feixe de raio-X podia
apresentar interferência. Como a interferência é um fenômeno
exclusivo de ondas, esse seria o teste decisivo. Só que ninguém
conseguia ver a tal interferência nos raios-X.
Foi então que o alemão Max von Laue deu a dica: o problema é o
comprimento de onda. Para ver interferência em ondas de luz visível
é preciso passar dois ou mais feixes através de fendas bem próximas
umas das outras. Para que a interferência apareça, a distância entre
essas fendas não pode ser muito maior que o comprimento de onda da
luz. É possível fazer essas fendas bem próximas para se observar a
interferência da luz visível; isso foi feito por Young. A gente vê
isso, hoje em dia, com muita facilidade. Basta olhar um CD contra a
luz. As cores brilhantes que aparecem são produto da interferência
da luz nas trilhas do CD, cujas distâncias são pouco maiores que os
comprimentos de onda do visível. Esse tipo de interferência é o que
chamamos de difração. Von Laue deu seu palpite: talvez não se
veja difração de raios-X em fendas porque não conseguimos fazer
fendas que estejam suficiente juntas umas das outras. O comprimento
de onda dos raios-X seria tão minúsculo que tornava impossível
produzir fendas ou trilhas tão próximas. Mas, lembrou ele, os
cristais têm planos bem regulares e bem próximos uns dos outros. Se
o raio-X tiver comprimento de onda comparável com a distância entre
esses planos, deve ser possível difratar um feixe de raios-X
passando através de um cristal.
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A experiência foi feita
pelos assistentes de von Laue, W. Friedich e P. Knipping e,
realmente, apareceram manchas na placa fotográfica que indicavam
claramente a difração. Do ponto de vista experimental estava tudo
dando certo. Faltava apenas achar uma teoria para explicar como
essas manchas se formavam e porque apareciam em direções bem
específicas. Quem desenvolveu essa teoria foram William Henry Bragg
e William Lawrence Bragg, pai e filho. Por esse trabalho ganharam o
prêmio Nobel de Física de 1915. |
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Vejamos como é essa teoria. Como
vimos na seção anterior, sempre que a diferença de fase entre duas
ondas for zero, 1 comprimento de onda, 2 comprimentos de onda etc,
as ondas interferem construtivamente e suas amplitudes se somam.
Mas, se a diferença de fase for de meio comprimento de onda, três
meios comprimentos de onda etc, elas interferem destrutivamente e
suas amplitudes se subtraem. |
Imagine então que um
feixe de raios-X incida sobre um cristal. Como o espaçamento entre
os átomos do cristal tem um valor comparável com o comprimento de
onda do raio-X, o feixe se refletirá nos planos dos átomos como em
um espelho. Veja o se passa com dois raios que incidem em planos
vizinhos. Os máximos ("altos") de cada onda são assinalados com uns
tracinhos.Um dos raios, que desenhamos em cor verde, incide no plano
de baixo e percorre uma distância um pouco maior que o outro,
pintado de vermelho. A diferença entre os dois caminhos é mostrada
na trajetória do raio verde, com uma cor rosa. Nesse desenho, essa
diferença é exatamente um comprimento de onda. Portanto, os raios
refletidos (ou "difratados", no caso) saem em fase e terão
interferência construtiva. É claro que isso só acontece para um
ângulo de incidência bem determinado.
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Veja agora um feixe
incidindo em um ângulo mais rasante. Nesse caso, a diferenca de
caminhos é menor. Desenhamos o caso especial em que a diferença de
caminho é exatamento meio comprimento de onda. Agora os raios
difratados estão defasados um do outro: um alto de um corresponde a
um baixo do outro. Haverá interferência destrutiva e os dois raios
se anularão. Isto é, nessa direção não haverá raios-X refletidos. |
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Agora podemos escrever
a chamada Lei de Bragg (que bem podia ser chamada de Lei
dos Bragg). Se você sabe um pouco de trigonometria pode ver, na
figura, que a diferença de caminhos é 2 d sen,
onde é o ângulo entre a direção dos raios-X e o
plano de átomos do cristal. A interferência será construtiva e,
portanto, haverá um feixe difratado apenas no caso em que essa
diferença de caminhos for um número inteiro de comprimentos de onda
do raio-X.
Isto é, se 2 d sen = n
(n = inteiro), haverá um feixe difratado. Essa é a Lei dos Bragg. |
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Existem várias
"famílias" de planos de átomos no cristal. A figura ao lado mostra
algumas como exemplo. Para cada uma dessas famílias poderá haver uma
direção, pelo menos, de feixe difratado resultando em um ponto no
filme. Usando essas fotografias um físico experimentado pode
determinar como são esses planos e obter a estrutura cristalina do
cristal. |
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Terminamos mostrando,
ao lado, um desenho feito pelo grande físico George Gamow. Esse
desenho é uma síntese de tudo que falamos nessa seção especial. Ele
mostra, à esquerda, von Laue e, à direita, Roentgen. Na frente vê-se
um tubo de raios catódicos com os elétrons bombardeando o anodo e
produzindo um feixe de raios-X. Esse feixe incide sobre um cristal e
se difrata produzindo um padrão de difração em um filme, na parte de
baixo da figura. |
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