Depois
de explodir na europa e nos EUA,
chega ao Brasil uma substância que já conquistou
milhões de usuários. O ecstasy é a droga do momento:
centenas de jovens, embalados por
músicas e luzes, consomem esta substância, em raves e
boates, com uma metodologia que lembra os antigos
rituais de uso de drogas nos povos antepassados. O que
torna esta molécula tão especial?
O Portal de Estudos em Química apresenta o MDMA e outras
feniletilaminas, moléculas
que são capazes de mexer
com a sua cabeça.
Noz Moscada:
uma droga alucinógena
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Muitas
plantas possuem compostos cujas
estruturas químicas lembram o MDA (metilenodioxianfetamina).
Entre estes, o sassafrás, a salsa, o
açafrão, anis e a noz moscada. Assim
como o MDA, suas estruturas lembram a
anfetamina, a dopamina e a mescalina. Os
seus efeitos também são parecidos com os
destas drogas: algumas causam euforia e
outras alucinações.
A noz moscada, que é a semente da planta
Myristica fragrans, é largamente
utilizada como tempero, no mundo
inteiro. Entretanto, por conter
compostos tipo-MDA, é também utilizada
como uma droga alucinógena,
principalmente por adolecentes e
presidiários.
A noz moscada já era utilzada com fins
medicinais desde o sétimo século A.C.,
por médicos árabes. Entretanto, o
primeiro relato de efeito psicotrópico
da noz moscada foi somente em 1576, na
descrição de uma "pregnant English lady
who, having eaten ten or twelve nutmegs,
became delirously inebriated".
Componentes do óleo de Noz Moscada:
elemicina
miristicina
safrol
O óleo da noz moscada contém vários
compostos precursores sintéticos de
drogas tipo-MDA. A maioria dos usuários
consome cerca de 20 gramas de noz
moscada, que contém, aproximadamente,
210 mg de miristicina (potencial MMDA),
70 mg de elemicina (potencial TMA) e 39
mg de safrol (potencial MDA). Estes
óleos não-amínicos podem ser
convertidos, in vivo, para as formas
amínicas, isto é, MDA, MMDA e TMA.
Muitas pessoas já experimentaram a noz
moscada como alucinógeno. Malcom X,
durante seu período na prisão, usou noz
moscada, e relata como sendo "a kick of
three or four reefers". Algumas pessoas
relatam que, inicialmente, se sentem
eufóricas. Mas o mais significativo e
frequente dos sintomas é o estado de
dormência e entorpecimento que surge
cerca de 2 horas após a ingestão. Mesmo
no dia seguinte as pessoas se sentem
meio "devagar".
A dose usual é cerca de 20 gramas de noz
moscada ralada, o que corresponde a 5 ou
6 unidades. Esta quantidade é suficiente
para causar sérios efeitos psicológicos
e fisiológicos. Estes efeitos variam com
o indivíduo, a dose e a procedência da
planta. Algumas pessoas gostam, mas a
maioria acha a experiência um tanto
ruim. Muitos tem dificuldade de ingerir
a droga (meio copo de "cerragem").
Alguns chegam a sofrer náuseas e enjôos
nos primeiros 45 minutos. Após estes
sintomas, um estado de euforia e
contentamento usualmente ocorre, seguido
da secura da boca e garganta, e um
envermelhamento muito pronuciado dos
olhos. Após um tempo a euforia passa, e
a maioria dos usuários se sente bastante
entorpecido, devido ao forte efeito
tranquilizante e calmante da droga.
Muitos não conseguem fazer outra coisa
senão se jogar no sofá. Uma das
melhores coisas que pode ser dita sobre
a noz moscada é que a experiência é
muito ruim para provocar o vício. |
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Centenas de jovens alucinados, cujo slogan é "Set
U Free". Este é o cenário de uma rave, festa de
jovens e adolecentes embalada por techno, luzes e o ecstasy.
O MDMA (N-Metil-3,4-metilenodioxiamfetamina,
comumente conhecido como Ecstasy, X, E, XTC, Adam, entre
outros) é uma droga com
intensa atividade psicotrópica. Na sua forma
pura, é um pó branco cristalino. É usualmente vendida na
forma de pó, misturado com excipientes, comprimidas em
drágeas ou em cápsulas.
O custo médio é de 20 a 30 dólares por cápsula. É ilegal na
maioria dos países. Pertence a classe das feniletilaminas,
da qual fazem parte as anfetaminas, a adrenalina,
a dopamina e a mescalina. Outros derivados
sintéticos da anfetamina, como a efedrina, são vendidos
livrementes nas farmácias, em descongestionantes nasais,
inibidores de apetite, entre outros.
O
mecanismo de ação
é o mesmo da grande maioria das drogas tipo-anfetamina: é a
potencialização dos sistemas nervosos central e periférico,
devido ao aumento na produção de acetilcolina. Acetilcolina
é um dos neurotransmissores, moléculas que transmitem sinais
químicos entre os neurônios. Mas os principais efeitos
mentais que o MDMA provoca devem-se a sua
interferência no sistema da 5-hidroxitriptamina (serotonina,
ou 5-HT). É o mesmo sítio ativado por drogas psicodélicas.
Sabe-se
que o MDMA aumenta a biodisponibilidade do 5-HT, por
dificultar a sua recaptação e estimular a sua liberação
pelos neurônios pré-sinápticos. O 5-HT está associado a
vários fatores no cérebro, como o sono, sonho, humor,
euforia, percepção sensorial, etc..
O MDMA provoca uma liberação massiva de 5-HT e, por isso,
apresenta um forte efeito
sobre o humor. Após algum tempo, o estoque de 5-HT
vai acabando e a biossíntese não atende a demanda. Chega-se
ao estado de depressão e esgotamento, que ocorre entre 6 a 8
horas após a ingestão da droga.
A Mescalina também é uma feniletilamina.
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Os efeitos da droga MDMA no organismo são muito
pronunciados, variando desde o estímulo até o relax. As
droga potencia os
estímulos sensoriais; por isso, nas raves, os
usuários encontram um ambiente perfeito, cheio de música e
luzes. Na psiquiatria, o MDMA era utilizado para surtir os
mesmos efeitos que, hoje, são causados pelo Prozac
(fluoxetina), conhecida como a droga da felicidade. As
pessoas ficam eufóricas, agitadas, mais emotivas e
pré-dispostas ao carinho, toque e sexo.
Muitos
usuários relatam efeitos desconfortáveis, como cólicas,
vômito e paranóias. Algumas pessoas ficam deprimidas nos
dias posteriores a ingestão da droga. Entretanto, um dos
piores e mais perigosos efeitos colaterais causados pelo
ecstasy é a súbita
elevação da temperatura corpórea (o MDMA provoca
hipertermia). Isto pode causar uma desidratação profunda e,
em muitos casos, levar à morte. Nas raves, os usuários
costumam ingerir litros de água, tentando resfriar e
hidratar o corpo. Embora não muito prejudicial a curto
prazo, o MDMA apresenta sérias injúrias a longo prazo. Uma
delas é a diminuição do peso do usuário, uma vez que o MDMA
inibe o apetite e provoca um grande desgaste calórico.
Existem vários artigos que evidenciam, também, a relação
entre o uso do MDMA e distúrbios cardio-vasculares.
XTC://
História
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1913:
O MDMA é sintetizado e patenteado pela MERCK.
A patente não menciona o uso.
1953: Exército
norte-americano testa a droga para
aplicações militares. Chegou a ser utilizada
como "droga da verdade".
1977: Alexandre
Shulgin, após obter o PhD em
Bioquímica, testa o MDMA e relata a
experiência a alguns amigos
1978:
O primeiro artigo
científico sobre o MDMA foi
publicado, por Alexandre Shulgin. Inicia-se
o uso terapêutico do MDMA, por psiquiatras
europeus e norte-americanos.
1977-1985: A "era
dourada" do MDMA. Como não era
ilegal, podia ser vendido livremente nas
ruas, boates, bares, farmácias e
danceterias. Muitos estudantes
norte-americanos usavam diariamente. Em 1984
o MDMA ganhou um
apelido: "empathy" que, logo depois,
transformou-se em "ecstasy".
1980: O ecstasy chega à Europa.
A droga foi logo adotada por muitos jovens,
principalmente na Inglaterra.
01/06/1985: O MDMA é,
finalmente, banido e considerado
ilegal nos EUA. O congresso americano o
colocou no topo da lista de drogas
proibidas: inicialmente, até mesmo a
pesquisa acadêmica da droga ou derivados foi
suspensa. Logo, a grande maioria dos países
sul-americanos e europeus também baniram o
ecstasy.
08/02/2000: Dois
estudantes de química
da Universidade Federal do Paraná e
um professor de colégio foram presos por
fabricar e vender ecstasy. Segundo a
polícia, o professor Daniel Gibson teria
encontrado a rota sintética da droga em uma
página na Internet.
05/06/2000: Manuela Kirschner,
filha do embaixador
brasileiro em Londres, e seu
namorado, Chrystian von Rogoschin, foram
presos em flagrante ao receber um pacote com
260 comprimidos de ecstasy. Mais um caso de
tráfico de drogas entre jovens de classe
alta do DF. |
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A síntese do MDMA é
relativamente simples, e diversos usuários acabam
"aprendendo" a metodologia, que consiste em vários refluxos,
extrações, destilações e recristalizações. Uma das rotas
sintéticas está esquematizada na figura abaixo. Neste
exemplo, o reagente de partida é o safrol, que pode ser
extraído do sassafrás. O safrol sofre uma isomerização,
resultando na mistura cis-trans do isosafrol. Este é
oxidado, na presença de peróxido, para uma cetona. Esta
sofre uma aminação redutiva com a formamida, resultando no
MDMA.
O safrol é o reagente de
partida para vários análogos da anfetamina e, por
isso, tem a sua venda controlada, no Brasil. Existe uma lei
ambiental que, também, proíbe a exploração da sassafrás para
a obtenção de safrol. Pesquisadores da Epagri já estão
condicionando uma planta do norte, a pimenta longa, também
rica em safrol, para o plantio em outras áreas do país. O
safrol é muito utilizado nas indústrias de cosméticos,
pesticidas/herbicidas, farmacêuticas e alimentos.
Desde
os tempos mais remotos, o homem tem se utilizado de
substâncias químicas, encontradas em plantas ou, mais
recentemente, sintéticas, para provocar
alterações no seu estado
mental.
Algumas
vezes associadas a cultos religiosos, ritos espirituais ou
práticas de iniciação, as drogas sempre fascinaram a
humanidade. Por serem capazes de alterar profundamente a
personalidade e interesses humanos, algumas drogas, com o
passar dos anos, se tornaram ilícitas. Outras, entretanto,
como o etanol, a nicotina e a cafeína, continuam legais,
fazendo com que determinados grupos na sociedade se
enriqueçam cada vez mais, a despeito dos males consequentes
do uso deliberado destas drogas.
A linha que separa as drogas
lícitas das ilícitas é tênue e, muitas vezes,
imaginária. Muito mais do que embasamento científico, esta
distinção se faz com base em parâmetros comerciais: qual
presidente seria corajoso o suficiente para, por exemplo,
banir o álcool ou a nicotina de seu país? O ecstasy é apenas
mais uma droga, destas que costumam aparecer a cada geração.
Com o acentuado avanço da química orgânica nas últimas
décadas, não será surpresa se, nos próximos anos, novas
substâncias, com efeitos diversos, sejam escolhidas pelos
jovens e adolescentes como novas portas para a fuga da
realidade.
O Portal de Estudos em Química (PEQ)
adverte:
O uso de drogas psicotrópicas é prejudicial à
saúde.
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