Pesquisadores
da Universidade de Duke nos Estados Unidos, entre eles o
brasileiro
Miguel A. L. Nicolelis
(professor titular do Departamento de Neurobiologia e
Co-Diretor do Centro de Neuroengenharia da Universidade de
Duke), publicaram recentemente na revista
Science estudos
sobre o desenvolvimento de uma nova técnica que poderá ser
usada no tratamento da doença de Parkinson. Caso venha de
fato a se concretizar, esta nova abordagem terapêutica será
uma alternativa para os pacientes que não respondem à
medicação, e representará um verdadeiro alento para aqueles
que têm sua qualidade de vida prejudicada pelos sintomas da
doença de Parkinson.
A
doença de Parkinson
ou mal de Parkinson, como também é conhecida, recebeu este
nome em alusão ao médico inglês James Parkinson, que
descreveu, em 1817, os sintomas da doença em sua principal
obra, um ensaio sobre os sintomas da “paralisia agitante”.
A doença de Parkinson caracteriza-se pela degeneração
crônica e progressiva do sistema motor, apresentando como
sintoma clássico o tremor nos membros superiores, capaz de
tornar a simples leitura de um jornal uma tarefa árdua. Esta
doença é causada principalmente por uma disfunção nos
gânglios basais, resultando na degeneração dos neurônios
dopaminérgicos do sistema nigroestriatal (Figura 1),
responsáveis pelos movimentos. Os principais sintomas da
doença de Parkinson apenas são perceptíveis clinicamente nos
pacientes após a degeneração de 60 a 70% dos neurônios
dopaminérgicos da substância nigra, o que resulta numa
redução de 30 a 50% nos níveis estriatais de dopamina.
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Figura 1.
Representação da via dopaminérgica do sistema
nigro-estriatal
(Figura adaptada de
http://www.cnsforum.com)
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Até hoje o tratamento de escolha para esta doença envolve a
terapia de reposição da dopamina, feita pela administração
de seu precursor bioquímico, a 3,4-di-hidróxi-L-fenilalanina
(L-dopa). Este tratamento é capaz de melhorar de
forma efetiva os sintomas associados com o mal de Parkinson,
porém, em longo prazo, a farmacoterapia com L-dopa
tem se mostrado pouco eficiente e causa diversas
complicações (ver Quadro 1).
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A L-dopa é convertida em dopamina pela
enzima dopamina descarboxilase, que está
presente no sistema nervoso central e
periférico. A L-dopa é combinada com um
inibidor da dopamina descarboxilase para evitar
os efeitos periféricos da dopamina. Como a
dopamina não ultrapassa a barreira
hemato-encefálica, sua administração não resulta
em efeito farmacológico útil ao tratamento da
doença de Parkinson. A L-dopa
ultrapassa a barreira e é rapidamente
descarboxilada em dopamina. O déficit de
dopamina é assim corrigido, porém de forma
inespecífica (é distribuída por todo o cérebro e
não apenas nas sinapses deficientes). Assim,
causa reação “on-off”, em que os movimentos com
tremores são seguidos por movimentos
demasiadamente bruscos (discinesias), devido à
estimulação de receptores que estão presentes em
vias extra nigro-estriatais, como receptores no
globo pálido interno. Suplementos de vitamina B6
são co-enzimas para a dopamina descarboxilase e,
portanto, devem ser evitados.
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Quadro 1.
Bioconversão metabólica da L-dopa em
dopamina
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Neste contexto, estratégias terapêuticas adicionais,
aplicadas juntamente com o tratamento farmacológico, têm
despertado grande interesse. Em particular, técnicas para a
estimulação elétrica dos gânglios basais, conhecidas como
estimulação cerebral profunda (ECP) são efetivas no
tratamento da deficiência motora associada à doença de
Parkinson. Outra vantagem desta terapia consiste na
possibilidade de redução das doses de L-dopa aos
pacientes acometidos pela doença de Parkinson. No entanto, a
grande desvantagem da estimulação cerebral profunda é a
necessidade de um procedimento cirúrgico demasiadamente
invasivo, bem como a imprescindível acurácia para atingir
estruturas cerebrais diminutas. Por estas razões, é
desejável que se desenvolva e identifique métodos menos
invasivos de estimulação elétrica do sistema nervoso central
com benefícios similares aos da ECP, porém, com menos riscos
e desconfortos para os pacientes.
Pesquisadores da Universidade de Duke desenvolveram um novo
método, menos invasivo, para estimulação elétrica dos
circuitos neuronais, que consiste na implantação de
eletrodos de platina bipolares posicionados na medula
espinhal da coluna dorsal (Figura 2). Estes pesquisadores
demonstraram, através de modelos animais agudos e crônicos,
que simulam os principais sintomas da doença de Parkinson,
que esta via de estimulação produz a uma significativa
restauração da locomoção em ratos e camundongos.
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Figura 2.
Representação da implantação do eletrodo de
estimulação na medula espinhal em camundongo
(Figura baseada na de
Fuentes et al. 2009)
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O novo método de estimulação da coluna dorsal (ECD) foi
também avaliado juntamente com a administração de L-dopa
para investigar a viabilidade de seu emprego associado à
farmacoterapia. A L-dopa foi administrada
isoladamente em camundongos com déficit dopaminérgico, e foi
observado que estes camundongos começavam a apresentar
alguma locomoção após a administração de 15 mg do fármaco.
Já quando a L-dopa foi administrada juntamente com
a ECD, observou-se que os camundongos apresentavam locomoção
com apenas 3 mg de L-dopa, ou seja, em combinação
com a ECD, apenas 1/5 da dose de L-dopa foi
necessária para reproduzir os mesmo efeitos. Este resultado
demonstra que a associação das terapias foi altamente
benéfica no modelo.
Os resultados expressivos do método de estimulação da coluna
dorsal, e sua natureza menos invasiva quando comparado a ECP
sugerem que esta técnica possa ser utilizada como uma
terapia complementar para o tratamento dos sintomas da
doença de Parkinson. A despeito disso, os pesquisadores da
Universidade de Duke propõem que a ECD deva ser investigada
mais extensivamente empregando outros modelos animais
capazes de reproduzir o quadro da doença de Parkinson,
preferencialmente modelos de longa duração, para que seja
avaliada a viabilidade desta nova técnica como potencial
tratamento de pacientes Parkinsonianos.
Agradecimento:
Ao Prof.
Carlos Alberto Manssour Fraga
pelas correções e sugestões.
Referências Bibliográficas
Fuentes, R.; Petersson, P.; Siesser, W. B.; Caron, M. G.;
Nicolelis, M. A. L. Science 2009,
323, 1578. [CrossRef]
Parkinson on Line. Disponível em: <http://www.parkinson.med.br/>.
Acesso em: 10 abril 2009.
Para saber mais:
Fahn, S. Ann. N. Y. Acad. Sci. 2003,
991, 1. [Link]
HornyKiewicz, O. Amino Acids. 2002,
23, 65. [CrossRef]
Benabid, A. L. Curr. Opin. Neurobiol. 2003,
13, 696. [CrossRef]
Para citar esta matéria:
Rodolfo do Couto Maia, Nova esperança de tratamento para o
mal de Parkinson, Novidades na Ciência – SBQ Rio, 26 abril
2009. Disponível em: <http://www.uff.br/sbqrio>
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