A Química na cozinha
apresenta: o sal
Aspectos
históricos
Sal de cozinha, sal-gema, sal
marinho ou, como combinamos na introdução deste
artigo, cloreto de sódio, teve muita influência
na vida do homem. Ele está presente desde os
tempos antigos. Símbolo religioso, moeda, fonte
de poder e motivo de conflitos, influiu até no
destino das nações.
Quem já não ouviu o
comentário: “Ela é linda, mas não tem o menor
sal?”. Alusões como essas são mais que figuras
de linguagem. O sal existe nos mares e nos
continentes, nas células e no líquido que as
envolve. A vida sem ele, portanto, não só não
teria graça, como metáfora, como não seria
possível. Por isso, o sal acabou ‘temperando’ a
história da humanidade. Ele começou a ser
explorado e usado no início do Período
Neolítico[1], cerca de 10 mil anos atrás, quando
surgiram a agricultura, a pecuária e as
primeiras comunidades rurais.

Figura 1
- Saleiro derramado em frente a Judas no quadro
"A última ceia", de Leonardo da Vinci
Muitos acontecimentos estão
associados ao cloreto de sódio, dentre os quais,
alguns curiosos. Destaca-se uma superstição que
foi publicada na revista Superinteressante, onde
conta-se que a obra “A última ceia” de Leonardo
da Vinci (1452-1519) retrata um saleiro
derrubado diante de Judas (veja Figura 1).
Uma das crendices da época dizia que, se uma
pessoa derramasse sal, deveria pegar alguns
cristais caídos e jogá-los para trás do ombro
esquerdo - o lado que representava o mal. Até o
século XIX, o cloreto de sódio era o único
agente utilizado para conservar os alimentos,
principalmente as carnes. Atuando como um agente
desidratante, impedia o surgimento de vermes, os
quais precisam da água para sobreviver. Uma
curiosidade interessante é que o sal foi a
origem da palavra ''salário’ ([Do lat.
salariu, ''ração de sal'', ''soldo''.]),
visto que os soldados do Império Romano recebiam
parte de sua paga em sal.
Acredita-se que foi
observando o gado localizar poços salgados que o
homem chegou ao sal. É sabido que animais com
deficiência de sódio no organismo são capazes de
achar, pelo olfato, águas salgadas. Mais adiante
veremos porque o corpo precisa de sal.

Figura 2
– Ilustração da mulher de Lot sendo transformada
em estátua de sal durante a fuga das cidades de
Sodoma e Gomorra.
Na Antigüidade, os assírios
já o utilizavam nos cultos. Na religião judaica,
por outro lado, o sal sempre teve forte presença
simbólica. O Antigo Testamento narra, por
exemplo, o caso da mulher de Lot que foi
transformada em estátua de sal porque olhou para
trás ao fugir de Sodoma e Gomorra, cidades
destruídas pela ira divina. Para os hebreus, o
sal era um elemento purificador, símbolo da
perenidade da aliança entre Deus e o povo de
Israel. O ritual de batismo da Igreja Católica
Romana, em que cristais de sal são colocados nos
lábios dos recém-nascidos, reafirma a crença
judaica no sal como purificador.
Na Idade Média, porém, a
antiga santidade do sal acabou se transformando
em malefício e proliferavam superstições como a
de que desperdiçar sal era mau agouro, além de
abjeto. Falando do Brasil, na sentença que
condenou o inconfidente Tiradentes à morte, em
1792, os juízes portugueses mandaram salgar o
chão de sua casa para que ali nada mais tornasse
a nascer.
Atualmente, graças aos
métodos físicos e químicos, o sal passou ao
segundo plano como conservante de alimentos. Mas
até o final do século XIX era o único agente que
preservava certas comidas. Na verdade, o sal
desidrata[2] a carne e o peixe, impedindo a
deterioração. Esta função serve para dar uma
idéia da importância econômica do sal na Europa,
em cujos portos e estradas circulavam dezenas de
milhares de toneladas do produto todo ano, na
passagem dos tempos medievais para o
renascimento.

[1]
Período Neolítico: Também conhecido
como Período da Pedra Polida, foi o momento
na história em que o homem (Homo sapiens)
conseguiu produzir instrumentos (lâminas de
corte, machados, serras com dentes de pedra)
mais eficientes e mais bem acabados.
[2]
Desidratar: Retirar a água.